Voltei. Mentira, tô bem longe de
Castilho. Porém, pra variar, o cenário político de nossa cidade continua tão
insólito que o silêncio tornou-se insuportável, mesmo à distância. Como de
costume, tentarei estabelecer uma relação absurda, mas que, por isso mesmo, faz
muito sentido.
A atual crise política é fruto de
um jogo bem sujo, porém bastante conhecido por nós. Todo mundo já ouviu falar
em caixa 2, compra de votos, presentinho de empresas a políticos como
retribuição por seus serviços prestados. Em Castilho, é muito comum conversas
do tipo, sobre supostas práticas corruptas: “para se eleger, fulano gastou 100
mil comprando votos” ou “empresa tal investiu em determinados vereadores só pra
ganhar a concessão”. Em Brasília, pior ainda. Sempre há acusações desse tipo,
mas nunca são comprovadas ou, ao menos, denunciadas, permanecendo obscura a atmosfera
política.
A Lava Jato criou um ambiente de
moralidade no país. De supetão, o judiciário (uma das instituições que menos
funcionam no Brasil) assumiu o papel do Juízo Final, Sérgio Moro o de messias
moral (Moro messias moral). De uma hora para outra, a corrupção passou a
escandalizar, como se fosse uma moda criada pelo PT e, especialmente, por Lula.
Este, por sinal, foi eleito o Judas da classe média: teria ganho um triplex, teria
ganho um sítio com uns pedalinhos.
Não duvido que Lula tenha ganho esses presentinhos e feito coisa
errada. Mas, o que me assusta, é que o querem preso não pelo que ele fez de
ruim, mas pelo que ele fez de bom. Grande parte dos reacionários que berram em
minha timeline têm usado essas acusações do triplex e do sítio pra dar início a
uma tempestade de rancor contra as medidas (mínimas, por sinal) de tentativa de
equalização social, como “bolsa família”, tudo regado a piadinhas em relação à baixa escolaridade do ex-presidente, a
ausência de um dedo nas mãos e, principalmente, sua origem nordestina.
Com Dilma não
é diferente. Fala-se das tais pedaladas fiscais como um crime terrível (99%
dessas pessoas só conhecem as pedaladas do Robinho) para, em seguida,
deflagrarem a misoginia: “essa mulher
feia não pode governar nosso país!”.
Pra piorar, é uma mulher feia que tem como mentor um nordestino sem dedo. O rancor é tão grande e o preconceito é tão
claro, que o fato de que os líderes do impeachment estejam até o pescoço
envolvidos no esquema de corrupção que a Lava Jato investiga (Aécio citado mais
de 6 vezes, Eduardo Cunha sendo o único réu com mandato, acusado de ter
dinheiro pra comprar 500 mil sítios escondido em contas por aí) não incomoda os
defensores da moral nacional.
Resumindo: a
luta contra a corrupção é só um pretexto. Lula preso e Dilma impeachada, a Lava
Jato some da mídia, vai pra gaveta e voltamos
a ser um país lindo, branco e cristão.
Créditos da foto: Moisés Eustáquio |
O caso do vereador Demis do
“Balcão de Emprego” ou Demis “Cantor” (que era muito melhor que o vereador) é interessante.
Demis está longe de ser Lula. Muito longe. Demis é um coitado que, a partir de
sua popularidade e da aliança com uma figura bastante contraditória da cidade,
conseguiu uma cadeira na câmara.
Conheci o Demis “Cantor”, um
rapaz simples, em busca de uma ascensão social, ingênuo em relação ao sistema
político, uma espécie de Lazarillo de
Tormes castilhense. Quando o “Cantor” passou a ser o do “Balcão de
empregos” e, consequentemente, o Vereador, por mais que tenha tido lições com
quem o ajudou a se eleger, adentrou ao sistema carregando ainda muito da ingenuidade
do “Cantor” em sua busca de ascender socialmente. Traído por seu assessor,
revelou uma suposta prática daquelas
que se comenta nos botecos e esquinas de Castilho, mas que ninguém consegue
provar. Não só revelou que ele teria aderido a esse sistema, como também afirmou
que “todo mundo faz isso”, segundo os trechos que tive acesso.
Agora, está sob os olhos da moralidade de seus pares...
Se Demis errou, tem que responder
por isso. Se comprovado, dificilmente não perderá o mandato. Perderá o mandato,
perderá a dignidade, porém, o “todo mundo faz” permanecerá nas conversas de
boteco e nas esquinas da cidade. Demis pagará sozinho por ter sido/ser o
“Cantor”.
Samuel Carlos Melo