segunda-feira, 22 de outubro de 2012

PARLA!







     Dizem que um ato vale mais do que mil palavras. Boa frase pra se vender produtos nos dias dos namorados, Natal e afins. Na vida real o buraco é mais embaixo. Advogo em causa própria, confesso. Não sou um homem de atos, sou um homem de palavra. Um verborrágico. Não daqueles verborrágicos que falam demais e não tem nada a dizer. Falar, eu falo pouco, mas dizer, isso eu  FAÇO muito. Essa é minha ação. Eu afirmo, reafirmo, nego. Tenho uma opinião sobre tudo. Às vezes você pode me ver andando com o olhar vago pela rua, pois eu estou com a cabeça a mil, debatendo comigo mesmo temas variados. Esse é o peso esquizofrênico de ser eu.
Nesse eterno dizer, às vezes me contradigo. Volta e meia alguém me cobra isso, dizendo que o que digo agora é diferente do que dizia antes. O que posso fazer se a memória não acompanha a vontade de sempre dizer algo sobre alguma coisa? Tento manter alguma coerência: “PSDBistas não vão para o céu”; “Em caso de dúvida, escolha o lado do contra”. Máximas do mínimo. O que eu quero é debater, discutir, afirmar, convencer. Na net, sou um polemicista. Se tu posta mamão, eu respondo abacate. Não é por mal. Mas se eu responder mamão também, ganho um emoction complacente. Se respondo abacate, pode ser que você me treplique um pepino e haverá debate na quitanda.
No que isso ajuda? Sei lá. As pessoas não gostam de pensar sobre nada. Quando surge um debate, logo vem alguém dizendo “ficam aí discutindo, mas não fazem nada”. Essa é uma versão menos elaborada da frase de efeito com a qual eu iniciei esse texto. O que vale é a ação? Bem, um cão só age. Faz isso o dia inteiro. Dorme, come, cruza, se coça. Nunca vi um cão parando para discutir temas amenos. Nossa vida tem ação o tempo todo. Mas não se anime. Você não se distingue muito de um cão. Você acorda, come, se coça, transa e, infelizmente, trabalha. De toda ação da sua vida, 99,99% será previsível e pouco impactante. Vez ou outra você vai dançar com seu amor numa chuva de verão, ou vai rasgar dinheiro na Time Square. Não, mentira. Essa última parte você nunca vai fazer.
  Se a ação é previsibilidade, a palavra e o pensamento são pura liberdade. Num dia absolutamente comum, no seu emprego entediante, você pensa um bilhão de atrocidades diferentes. Desse caos você filtra a maioria, mas ainda sobra muito para ser proferido em diálogos de todo tipo.   Não há limites para a palavra. Não é a toa que o primeiro, principal e mais permanente ato de toda ditadura é tentar controlar o pensamento e a palavra, pois ambos não seguem regras. São livres... ou ao menos deveriam ser.
       Achar que a palavra não vale nada perante a solidez da ação, é entregar-se a uma visão pragmática da vida. Just do it, diz um dos slogans mais conhecidos do mundo. Action! Pede o diretor implícito. Ação sem reflexão. Ato contínuo. Pois eu digo: aja pela palavra, pelo pensamento. Diga, fale, grite, escreva, pense, argumente, negue, afirme, seja irônico. Responda com o silêncio quando pedirem voz, com peidos de suvaco quando pedirem palmas. Somos só uns bunda moles atrás de um computador, mas esse é um exército que incomoda. Deus não fez a luz, ordenou que ela existisse. Ordene uma revolução e quando ela vier, aja! Esse ato valerá por mil palavras. Nada que faça falta. Outras mil se seguirão.


Juliano Cardoso

Radiohead - Paranoid Android




4 comentários:

  1. Adorei! É óbvio que as pessoas se tornam "mais palavras" que ação. Os meios mudaram, as vontades, asociedade mudou, porém ainda há possíblidade de mobilização pela palavra, confortavelmente sentado atrás de uma tela de computador...Mesmo você sendo um nerd idiota, hoje a palavra tem peso maior e, futuramente, nem se comenta. Logo não é falta de ação, é ação confortável. Coincidentemente, meu artigo é sobre a mudança dos movimentos sociais...Do físico à palavra!

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  2. O que vale mais, ação sem reflexão ou reflexão sem ação? A partir dessas belas palavras pensada e acionada pelo amigo Juliano, podemos pelo menos, ser críticos, e, se há alguma ação a partir das palavras, que seja pensada, refletida. Vida longa a libertação da alienação!

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  3. Interessante. A palavra ainda tem sua força, e acredito que sempre vai ter. Ela incomoda, provoca, conforta, etc. A palavra com reflexão, pode valer mais que uma ação descontrolada, impensada. O primeiro passo é refletir, falar, e sem dúvidas agir. Bonito texto Juliano!.

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  4. Bem lembrado - A luz veio pela palavra! Parabéns pelo texto.

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