Pensei muito antes de redigir este artigo.
Pensei no debate que há muito tempo se entrava entre os profissionais da
educação e a população e nos cursos de formação com relação ao tema. Pensei na
luta dos professores por melhores condições e pela valorização de sua profissão.
Pensei nos avanços substanciais do processo de transformação da visão de
educação nas últimas décadas. Pensei nas grandes demandas da educação atual
perante a sociedade brasileira. Por último, pensei, enquanto profissional da
educação, na minha responsabilidade de me propor ao debate, enriquecer o campo
das discussões referente ao tema que se apresenta, contribuir assim, para o
esclarecimento e o desenvolvimento da sociedade.
Instiguei-me a fazê-lo depois de ler uma reportagem
que discorria sobre determinação da Promotoria de Justiça da Infância e
Juventude desta Comarca, no que tange ao oferecimento de vagas em instituições
de Educação Infantil, que o serviço seja disponibilizados ininterruptamente – o
que subentende que deverá oferecer atendimento durante período de férias e
recesso escolar – conforme Processo número 324/2011 e Sentença publicada em
17/01/2013.
Não é recente, nem única do Juízo desta
Comarca, manifestações de órgãos do Poder Judiciário, determinando o funcionamento
das creches e pré-escolas em período de férias ou recesso escolar. Como também
é corriqueira a mobilização das instituições educacionais e dos sindicatos da
classe docente, que recorrerem aos órgãos competentes a fim de reverterem
legalmente as determinações aventadas.
Em março de 2011, o Tribunal de Justiça de São Paulo
(TJ-SP) determinou à prefeitura da capital do Estado que mantivesse o funcionamento
das creches e pré-escolas em período de férias ou recesso escolar. Na ocasião,
houve debates sobre o tema e a Secretaria de Educação de São Paulo consultou o
Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão consultivo e normativo que refutou a
decisão do TJ-SP, por meio de parecer técnico. Situações análogas ocorreram em
outros municípios paulistas e de outros Estados da federação, tendo sempre o
mesmo desfecho: debates e “quedas de braço” entre os órgãos e poderes da
República.
Na semana passada o parecer do CNE foi homologado pelo
Ministro da Educação Aloizio Mercadante e pode tornar-se uma das diretrizes da
Educação Infantil. (Consultas: http://www.fae.ufmg.br/nepei/pagina.php?page=férias e Parecer CNE/CEB Nº 8/2011 e Parecer
CNE/CEB nº 23/2012 – D.O.U. de 19/3/2013, Seção 1, Pág. 10).
Segundo
o CNE as creches não devem ser vistas como unidades assistencialistas, mas sim
educativas. "A criança tem direito a uma convivência intensiva e extensiva
com a sua família", afirma Cesar Callegari, membro do CNE e relator do
parecer, na época. O conceito meramente assistencialista da creche, como
instituição guardadora de crianças – alguns preferem usar o termo “depósito de
crianças” – é ultrapassado, simplista e não condiz com as diretrizes da
política nacional de educação para os pequenos.
O CNE reafirma que férias escolares na Educação
Infantil se fazem importante “para
estimular a convivência familiar da criança (arts. 227 e 229 da Constituição
Federal), seja para viabilizar a adequada organização pedagógica e curricular
das unidades de Educação Infantil, preservando, igualmente, a relação e a
identidade entre professor e alunos, que se mostra ainda mais importante nas
primeiras experiências da educação formal”, além de ser este período
indicado para se realizar serviços de manutenção, dedetização e desratização do
espaço físico escolar, além do planejamento.
A
criança não vai à creche simplesmente porque seus pais trabalham e não têm com
quem deixá-la, ou porque na creche se oferece complementação alimentar. Muito
além desses objetivos, a creche e a pré-escola têm “como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de
idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,
complementando a ação da família e da comunidade” (Lei nº 9.394/1995, arts.
29 e 30 – e alterações), portanto essas instituições são, acima de tudo,
escolas e devem funcionar como tal.
No
tocante às férias, os professores devem gozá-las coletivamente, de acordo com a
Convenção Coletiva de Trabalho dos professores de Educação Básica, cláusula 43
(CCTEB). É por esse motivo as creches e pré-escolas interrompem o atendimento
ao público (suspendem as aulas) durante o período de férias e ou recesso
escolar, tornando-se impraticável que os docentes destas instituições cumpram
suas férias em regime de revezamento.
A
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) assegura que os professores possam
gozar de férias parciais (divididas), mas estas nunca devem ser inferiores a
dez dias (art. 139) e carecem de aprovação prévia por órgão colegiado, além de
previsão no calendário escolar. Nesse caso, nenhum dos dois períodos pode
coincidir com o recesso escolar, previsto na CCTEB, cláusulas 44, assim se
parte das férias for gozada em julho, deverá ser antes ou após o recesso
escolar previsto para o mês.
No
caso dos docentes do quadro municipal de Castilho têm direito a trinta dias de
férias e quinze dias de recesso escolar, de acordo com o art. 56 da LC nº
15/2005 e suas alterações (Plano de Carreira e de Remuneração do Magistério Público
Municipal de Castilho) e não há previsão para férias parciais, exceto para
detentores de funções gratificadas, que obedecerão “ao que dispuser o Diretor do Departamento de Educação” (§ 2º).
Por estar em
confronto com o Parecer CNE/CEB Nº 8/2011 e Parecer
CNE/CEB nº 23/2012 homologado pelo Ministro da Educação, Aloisio Mercadante, é
que afirmo que a determinação da Promotoria
de Justiça da Infância e Juventude da Comarca de Andradina está na contramão da
política nacional de educação do Brasil.
Mas “há uma luz no
fundo do túnel”, para a Promotoria de Justiça da Infância e Juventude e,
sobretudo, para as famílias que demandaram a ação desse órgão. De acordo com o
voto dos relatores de ambos os pareceres fica evidenciada a legitimidade da
demanda da população em requerer atendimento das creches e pré-escolas que
diferem do atendimento regular, como sendo à noite, aos finais de semana e
durante férias e ou recesso escolar. Porém, este atendimento almejado, que não
“pode ser intempestiva ou emergencial, e nem deve abranger todo o período
das férias das crianças” (Parecer CNE/CEB Nº 8/2011) “enquadra-se no âmbito de “Políticas
para a Infância”, devendo ser financiado, orientado e supervisionado por outras
áreas, como assistência social, saúde, cultura, esportes e proteção social” (Parecer CNE/CEB Nº 23/2012) com
disposição de instalações físicas, equipamentos, materiais, profissionais e
programação adequados, e não simples e unicamente, delegados a área de educação
e seus profissionais, incorrendo na supressão de seus direitos trabalhistas e
no desmonte de sua ação específica. Ainda, prevê a possibilidade de criação de
mecanismos de articulação das áreas outras, que venham possibilitar o
atendimento à população sem descaracterizar os critérios pedagógicos, o calendário
escolar, os horários e as demais condições de funcionamento das instituições da
Educação Infantil.
Vê-se que nem sempre a medida impositiva
seja o caminho curto para a resolução das questões. O debate amplo envolvendo
os setores afins, a consulta aos profissionais especialistas, temperados com
uma boa dose de serenidade é ainda a melhor receita para um desfecho aprazível
e de sucesso.
VANDECIO
CARVALHO.
Pedagogo,
Psicopedagogo e
Docente
na Rede Municipal de
Ensino
de Castilho.
Indico a leitura de História e educação na sociedade de classes, de Jean Paulo Pereira de de Menezes, (Org.), com capítulos de Antonio Rodrigues Belon (AS LUTAS DOS PROFESSORES), Ari Raimam, Áurea de Carvalho Costa, Jean Paulo Pereira de Menezes(Organizador); Lesliane Caputi, Luciana Belíssimo de Carvalho, Maria Denise Guedes, Melina Lima Pinotti , Saulo Alvaro de Mello, Telma Ressineti, Vanessa Batista de Andrade, da Ed. Clube de Autores, São Paulo 2012.
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