terça-feira, 27 de agosto de 2013

#escatologia e médicos cubanos



Há uma semana um revertério abalou minha hercúlea saúde. A moléstia me pegou pela boca da noite e na virada de domingo para segunda tive uma madrugada de rei. Muito vômito e diarreia. Aqui abro um parêntese vocabular para prestar deferência ao termo que, por escrúpulos bobos, quase não é usado: Caganeira. Ora, que palavra! Não deve haver em nossa língua palavra mais foneticamente arranjada para colar um significado ao um significante. Mas notem que há sutil diferença entre a caganeira e a diarreia. É sonoro, preste atenção. Caganeira pressupõe pressão, potência do corpo em expelir o imprestável. Diarreia já é algo menos substancial, já mirrado da jorrosa potência do ventre. Então, vamos dizer que eu anoiteci com caganeira e amanheci com diarreia.
                Amanhecido o dia, eu já esgotado, que de tanto cagar já estava com a cabeça vazia, resolvi que precisava ir a um médico. Havia duas razões para isso: a primeira era que precisava de um atestado para a minha falta no serviço. A segunda era que, apesar de nesse momento minha formação nas ciências ocultas já me permitisse o diagnóstico de uma virose, minha situação de exilado aqui nesse rincão de Mato Grosso me deu a sensação de fragilidade. Eu queria ser avaliado por um médico. A ideia de jazer numa louça fria não me parecia muito glamourosa, embora digam que Elvis tenha morrido assim, se é que ele realmente morreu.
                7 e pouco da manhã eu vou para um hospital que há aqui a uma quadra da minha casa. Entro e saio da recepção duas vezes, reluto porque não gosto de hospitais. Mas não tem jeito, vou até a recepcionista e faço minha ficha. Então ela me informa que o médico atende em outro posto antes e só chega às 10:30. Olho para a sala de recepção, um cubículo mal ventilado de uns 4 x 3 m. já abarrotado de gente. Como moro perto, volto e durmo.
                10:30, estou de volta ao hospital. Minha formação em ciências ocultas é ampla, e como eu já tinha meu próprio diagnóstico já sabia também que o meu melhor tratamento era cama, repouso e muito líquido. Mas precisava do bendito atestado. 11:00... 11:30.. e enfim chega o médico. Volto à recepção e pergunto o quanto vai demorar. A recepcionista diz que não tem noção. Cansado, pergunto se ali se faziam consultas particulares, ela me responde que sim. Pergunto o preço, 150 reais. Ok, fazer o que. Ando mais umas 4 quadras, vou ao banco, tiro o dinheiro e volto. Então sou avisado que como só havia um médico, pagar ou não era indiferente, a espera era a mesma. Naquele momento, não obstante minha profunda angústia, perna bamba, língua macilenta, corpo desidratado, tive um momento de felicidade. Ali, naquele hospital, fez-se a justiça: não importava ser um miserável ou um funcionário público federal. Estávamos todos fudidos.
                Moribundo, vou até um barzinho de frente para o hospital comprar água e tenho o divino insight: não haveria uma clínica particular na cidade? Pergunto a um senhor no bar e ele me confirma que existe sim. Saio de lá, pego um moto-taxi e chego à clínica. Lá, ar condicionado e três atendentes. Cada uma representando três médicos. Procuro um clínico-geral, me indicam. Pago 180 reais na consulta e sou atendido em questão de uns 15 – 20 minutos. Um médico gentil me atende, me chama de filho. Sento na maca, estetoscópio no peito, costas, barriga. Pergunta minha profissão, digo professor. Ele brinca: “sofredor”. Diz que esses dias um paciente professor disse que ganha 1800 por mês, sendo que ele paga 1600 para sua atendente. Enfim, consulta, remédios, exames, retorno. Uma semana tu tá bom.       
Voltei para casa em torno de 13:00.  Mas, eu juro, antes de tomar água de coco e apagar na cama... eu me lembrei daquelas pessoas que ficaram naquele hospital, desde não sei que hora da manhã para serem atendidas a não sei que horas da tarde. É por elas que eu digo: sobrando uns 2 ou 3 cubanos, espanhóis, americanos, coreanos ou brasileiros de bom coração,  pode mandar para cá: Hospital Vale do Guaporé, cidade Pontes e Lacerda – MT.

                                                                                                       Juliano Cardoso

Um comentário:

  1. Que merda heim Juliano, não o texto, a situação que a saúde se encontra! melhoras camarada.

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